Eco e Narciso

    O amor não é sempre como nós queremos que seja. Para amar, é necessário que as duas pessoas estejam dispostas a se entregar, e a começar a fazer parte um do outro, se unirem como um só corpo... Uma só alma... Boa leitura!!

                                                                                                             Texto por Ana Maria Machado


Eco era o nome de uma ninfa muito tagarela, que conversava muito e sem pensar. Não conseguia ouvir em silêncio quando alguém estava falando. Sempre se intrometia e intenrrompia, nem que fosse pra concordar e repetir o que o outro dizia. Um dia , fez isso com a ciumenta deusa Juno , quando ela andava pelos bosques furiosa, procurando o marido Júpiter, que brincava com as ninfas. Atagarelice de Eco atrasou a poderosa Juno, que resolveu:
  -De agora em diante, sua língua só vai servir para o mínimo possível.
 E a partir desse dia, a coitada da Eco só podia mesmo repetir as últimas palavras do que algém dissesse.[...]

Por isso, algum tempo depois, quando ela viu um rapaz belíssimo e se apaixonou por ele, tratou de ir atrás sem dizer nada, em silêncio. Esse rapaz se chamava Narciso e dizem que foi o homem mais bonito e deslumbrante que já existiu. Todo mundo se enamorava dele, que nem ligava.

Eco ficou louca por Narciso e o seguia por toda a parte. Bem que tinha vontade de se aproximar e confessar seu amor, mas não tinha mais sua própria fala... [...] Só lhe restava ficar escondida, por perto, esperando que ele dissesse alguma coisa que ela pudesse repetir.

Um dia, o belo Narciso estava passeando no bosque com uns amigos, mas se perdeu do grupo e não conseguiu encontrá-los. Começou a chamar:
-Tem alguém aqui?
Era a chance da ninfa! E ela logo respondeu, ainda escondida:
-Aqui! Aqui!
Espantado, Narciso olhou em volta e não viu ninguém. Chamou:
- Vem cá!
Ela repetiu:
-Vem cá! Vem cá!
[...]

O rapaz desistiu:
-Vamos nos encontrar...
Toda feliz, Eco saiu do meio das árvores e correu para abraçá-lo, repetindo...
-Vamos nos encontrar...
Mas ele fugiu dela, gritando:
-Pare com isso! Prefiro morrer a deixar que você me toque!
A pobre Eco só podia repetir:
-Que você me toque... que você me toque...
E saiu correndo, triste envergonhada, para se esconder no fundo de uma caverna. Sofreu tanto com essa dor de amor, que foi emagrecendo, definhando, até perder o corpo, desaparecer por completo e ficar reduzida apenas a uma voz, repetindo as palavras dos outros - isso que nós chamamos de eco.

Narciso continuou sua vida, sempre da mesma maneira. Sem ligar para ninguém, nunca se importando com os outros, brincando com o sentimento alheio. Até que alguém, que ele fez sofrer muito, rezou para Nêmesis, a Deusa do Destino, e pediu:
-Que ele possa amar alguém tanto como nós o amamos! E que também seja impossível que ele conquiste seu amor!
Nêmesis ouviu a oração. Achou que era justa e resolveu atender ao pedido.

Havia no fundo do bosque um laguinho de águas cristalinas e tranquilas, onde nunca vinha um animal beber água e não caíam folhas ou galhos secos - um verdadeiro espelho. Era cercado por uma grama verdinha e macia, e muito fresco. Um lugar gostosíssimo. Um dia, no meio de uma caçada, Narciso passou por ali. Com sede resolveu tomar um poco d'água. Deitando na margem, com a  cabeça debruçada sobre o lago, ficou encantado pelo belíssimo reflexo que via. Nunca tinha se visto num espelho e não sabia que era a sua própria imagem. Mas imediatamente se apaixonou, maravilhado por tanta beleza. Ficou ali parado, contemplando aquele rosto mais bonito do que jamais vira. [ ...]
Os amigos apareceram para procurá-lo, mas ele não deu atenção. Chamaram-no para ir embora, mas ele ficou. Olhando o reflexo no lago.
[...]

Muito tempo Narciso ficou ali, sem comer nem dormir, admirando aquele por quem estava tão apaixonado. Chorou - e suas lágrimas caíram sobre a imagem, que chorava com ele, e ficou turva.
-Ai de mim! - gemia ele.
A única resposta que tinha era de Eco, sempre escondida:
-Ai de mim!
Desinteressado de tudo, cada vez mais fascinado por si mesmo, foi definhando. Ao perceber que ia morrer, suspirou:
-Adeus!
Fechou os olhos, deixou cair a cabeça sobre a grama. Na água, orosto sumiu. Só Eco respondeu:
-Adeus!

Mais tarde, os maigos voltaram. Mas já o encontraram morto. Prepararam tudo para o funeral, mas, quando vieram pegar o corpo, não estava mais lá. Em seu lugar nascera uma flor perfumada e linda, com uma estrela de pétalas brancas em volta de um miolo amarelo. Para sempre chamado narciso.

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